quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Amor de mãe - um outro olhar

Leblon / Rio de Janeiro / 27.02.07


Eu ia andando pela Avenida Copacabana e olhava distraída edifícios, nesga de mar, pessoas, sem pensar em nada. Ainda não percebera que na verdade não estava distraída, estava era de uma atenção sem esforço, estava sendo uma coisa muito rara: livre. Via tudo, e à toa. Pouco a pouco é que fui percebendo as coisas. Minha liberdade então se intensificou um pouco mais, sem deixar de ser liberdade. Não era tour de propriétaire, nada daquilo era meu, nem eu queria. Mas parece-me que me sentia satisfeita com o que via.
Tive então um sentimento de que nunca ouvi falar. Por puro carinho, eu me senti a mãe de Deus, que era a Terra, o mundo. Por puro carinho, mesmo, sem nenhuma prepotência ou glória, sem o menor senso de superioridade ou igualdade, eu era por carinho a mãe do que existe. Soube também que se tudo isso "fosse mesmo" o que eu sentia - e não possivelmente um equívoco de sentimento - que Deus sem nenhum orgulho e nenhuma pequenez se deixaria acarinhar, e sem nenhum compromisso comigo. Ser-lhe-ia aceitável a intimidade com que eu fazia carinho. O sentimento era novo para mim, mas muito certo, e não ocorrera antes apenas porque não tinha podido ser. Sei que se ama o que é Deus. Com amor grave, amor solene, respeito, medo e reverência. Mas nunca tinham me falado de carinho maternal por Ele. E assim como meu carinho por um filho não o reduz, até o alarga, assim ser mãe do mundo era o meu amor apenas livre.

Clarice Lispector in Felicidade Clandestina ("Perdoando Deus")

18 comentários:

Anônimo disse...

Pois é..
Existem palavras que não cabem outras palavras, Clarice é assim, plena!
Lindo dia bunita
beijosssssssssss de sampa

Mônica disse...

esse texto está marcadíssimo em meu livro.....

beijos, boneca

marta r disse...

Bela foto, belissimo texto.

Anônimo disse...

Um destes dias, eu ainda vou começar a ler Clarice e vai ser graças a ti. Bjos de boa tarde!

Gioconda disse...

aiiii que eu adoro esta mulher!

Custódia C. disse...

Eu também descobri a Clarice por tua causa. E que bela descoberta !

Taia disse...

O que é mais belo, o texto ou a foto?
Perfeito!
Beijo minha Tri, de quem to doida de saudades!

Suzi disse...

Clarice é tudo, Marcinha.
Amo mesmo cada palavra.
;o)

Lindo dia pra ti também!!

Anônimo disse...

Que lindo! Nunca tinha lido nada dela. Vou correndo para a Bliblioteca. Bjs

Suzi disse...

É, Moniquete,
há tanto pra se marcar nos livros da moça, né?
;o)

Suzi disse...

Os elogios pela foto eu agradeço em meu próprio nome; pelo texto, agradeço em memória de Clarice, Martita...
;o)

Suzi disse...

Miguelito, vais amar...
;o)

Beijos de boa tarde também.

Suzi disse...

É, Gio,
ela é nossa queridinha, né?
;o)

Suzi disse...

Verdade, Custódia! Lembro do dia em que, no meio das férias, saíste a passear e voltaste da livraria, depois de um chá, com "A Hora da Estrela". Não foi assim mesmo?
Eu lembro!
;o)

Suzi disse...

Taia, querida tri,
eu diria que o texto é infinitamente mais belo; mas confesso que esse tom de sépia na fota deu um ar nostálgico muito bom! E eu gostei também!
;o)

Sodads de tu!!!

Suzi disse...

Dani,
é sempre assim... tudo dela é tão lindo!
;o)

Anônimo disse...

Tiro o meu chapéu a Clarice Lispector(ela é de facto excepcional). Lindo texto, bela foto. Pela escolha, uma "chapelada" também para ti.

Um beijo de boa noite

Suzi disse...

Beijo de boa noite pra você também, Clau.
Clarice tem palavras lindas. As fotos apenas tentam acompanhar.
;o)