Um post sobre presentes

No dia 31 de janeiro, quando fui levá-la ao médico, caminhando por aquele hospital enorme nós nos deparamos com uma lojinha. Curioso como nós duas batemos a vista ao mesmo tempo na mesma coisa: uma agenda. Fomos olhar de mais perto, mas o quiosque estava fechado. Mais tarde, naquele mesmo dia, fomos a outra Unidade do Inca para marcar a radioterapia. Próximo à saída, havia também uma loja. Eu vi primeiro. Mostrei. Estava aberta. Corremos pra lá. Não vi exposta, a agenda, e então perguntamos. A senhora disse que tinha, sim, e delicadamente colocou-as no balcão, para escolhermos.

Enquanto eu pensava em dar de presente pra ela, ela agia. Rapidamente sacou o dinheiro e pagou as duas. Eu queria dar de presente. Ela também. Insisti. Ela também. Do jeito dela, foi brigando comigo, porque queria me dar a agenda, pagando a conta, e me puxando pra sair, dizendo pra senhora que nem tocasse no meu dinheiro, porque era falso.

E foi assim que eu ganhei o último presente; e você não me viu sair de casa, um dia sequer, desde então, sem a minha agenda.



Dias depois, com semelhante amor, C.C.C. me deu estas palavras:

"E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre."
[Miguel Sousa Tavares]