sexta-feira, 21 de setembro de 2007

No dia da árvore

Um texto de Rubem Alves

Era o dia 1º de maio, dia do trabalho. Cidade vazia, céu muito azul. Subia com o meu carro em direção a Pocinhos do Rio Verde. Estranhei que houvesse tantas pessoas trabalhando no jardim da praça dos Expedicionários, ao fim da Rua Eduardo Lane. Não, não eram funcionários da prefeitura. Fiquei curioso. Parei. Desci do carro e perguntei. Um homem me respondeu, sorridente: “Somos da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Resolvemos aproveitar o dia para cuidar desse jardim...” Fui tomado por uma perplexidade alegre. Tive vontade de abraçar aquele homem. Eu, que não sou de Igreja, amei aqueles desconhecidos. Pode ser que nossas idéias teológicas não combinem. Mas, que importa? Concordamos em que jardinagem é um ritual litúrgico, uma forma de anunciar o Paraíso. Deus é jardineiro. Criou o universo para plantar nele um jardim. Pensei que há tantas comunidades religiosas em Campinas. Não seria bonito se cada uma delas tomasse um jardim público sob os seus cuidados?

Há árvores maravilhosas em Campinas, árvores que merecem ser vistas. Três delas se encontram na praça defronte ao Hospital da Beneficência Portuguesa. Enormes. Não sei o que são, porque nunca vi iguais. Algum agrônomo ou paisagista poderá me dizer? Também na Fazenda Santa Elisa, no gramado central, há três lixias, as maiores que já vi, grandes como as mangueiras antigas. Seria interessante que houvesse mapas com caminhos de peregrinação pelas árvores: o caminho dos ipês floridos, o caminho das quaresmeiras floridas, o caminho das patas de vaca floridas... Pois não há as estações da paixão de Cristo que os devotos visitam de forma compungida? O caminho das árvores floridas talvez pudesse ser chamado de Estações do Cristo Ressuscitado, a ser trilhado com alegria. Olhar as árvores é uma forma de oração.

Triste é a praça do Castelo, sem árvores, deserta, vazia de pássaros e sombras. Terá sido projeto do Niemeyer? O Niemeyer detesta árvores. Ele ama as formas geométricas, perfeitas por sua beleza imóvel. A beleza imóvel é eterna. Não está sujeita às transformações do tempo. Uma vez construídas elas atravessam os séculos. Mas o preço que se paga pela eternidade das formas é que elas têm de estar mortas. A inspiração vem das pirâmides, que são monumentos mortuários. Já visitaram o Memorial da América Latina? Um horror. Os interiores têm a beleza imóvel dos sepulcros. Creio que, se ele pudesse, faria árvores de cimento. É preciso ressuscitar a praça morta do Castelo. Plantar árvores. Palmeiras, por amor aos céus. Calaburas, por amor aos pássaros. Magnólias, por amor ao perfume. Sombras. Bancos. Fontes...

Rubem Alves - Quarto de Badulaques XXIV


É preciso ressuscitar as praças, as ruas e avenidas,
o jardim da sua casa, as árvores da sua vida.
21 de setembro - Dia da árvore.
Plante. Cuide.
Saúde!

Foto de Sandra
Parc du Bois-de-Coulonge - Québec - Canada

8 comentários:

Taia disse...

É primavera lá em casa já.
Estou replantando o jardim da vida, as flores nos vasos.
Nos sanguineos e nos de barro.
Dia da árvore, do oxigenio, dia de ser melhor.
Vamos plantar?
Beijoca.

Custódia C. disse...

O jardineiro hoje já passou por aqui :)

Suzi disse...

Gostei muito de ler essas suas letrinhas, viu, Taia?
Eu sei que você sabe.
;o)

Suzi disse...

E a imagem do teu canteiro já está linda, Custódia!!!

Beto disse...

Boa Suzi!
bjs

Suzi disse...

;o)

Sandra Vicente disse...

Que legal ter colocado minha foto! E nós celebrando a explosão de cores do outono.

Suzi disse...

Essa foto está fantasticamente linda! O contraste do roxo com o verde, as crianças ao fundo, o imenso jardim...
Linda, linda, linda!!!

;o)